Kant era famoso por sua pontualidade e regularidade em suas atividades diárias. Dizem que ele era tão preciso em seu cronograma que os moradores de Königsberg, cidade onde ele viveu, podiam ajustar seus relógios ao vê-lo passar em seu passeio diário pela cidade.
Explorando as Diferentes Facetas do
Conhecimento: Tipos, Justificação e Argumento
Existem dois tipos distintos de sabedoria, justificação ou
argumento que são utilizados na filosofia para discernir entre eles com base na
confiança em evidências ou experiências empíricas. Um desses tipos é conhecido
como "prévio", referindo-se àquilo que não depende da
experiência. Exemplos incluem matemática, tautologias e raciocínios lógicos
puros. O segundo tipo é denominado "posterior", pois se apoia em
evidências empíricas. Ele engloba a maioria dos campos científicos e elementos
do conhecimento pessoal.
Embora esses termos tenham sido mencionados anteriormente
nos Elementos de Euclides, foi através da influente obra Crítica da Razão Pura,
escrita por Immanuel Kant, que eles ganharam popularidade. Essas expressões são
principalmente utilizadas como modificadores do substantivo "sabedoria" (ou seja, "sabedoria
prévia"). Além disso, o termo "prévio" pode ser empregado
para modificar outros substantivos, como "verdade". Os
filósofos também podem empregar palavras como "previsão",
"previsista" e "previsicidade" como substantivos que
descrevem a qualidade de algo sendo prévio.
Exemplificando as Distinções
Para compreender melhor a distinção entre conhecimento a
priori e a posteriori (ou justificação), podemos recorrer a exemplos
concretos, como os seguintes:
Conhecimento a priori
Vejamos a seguinte afirmação: "Se todos os triângulos possuem três lados, então o triângulo
que estou desenhando agora possui três lados." Essa é uma afirmação
que podemos conhecer a priori, pois sua validade pode ser derivada unicamente
pela razão e lógica.
Conhecimento a posteriori
Agora, comparemos o exemplo anterior com a seguinte
afirmação: "O resultado do experimento mostrou que
a substância A reage com a substância B para formar o composto C." Essa
é uma afirmação que, se for verdadeira, só podemos conhecer a posteriori, pois
sua veracidade depende de evidências empíricas e experiência direta.
Aprioricidade, Analiticidade e Necessidade:
Explorando suas Relações
Diversos filósofos, em resposta a Immanuel Kant, têm se
dedicado a explicar o conhecimento a priori sem recorrer a uma suposta "faculdade
especial" que ainda não foi adequadamente descrita, como argumenta
Paul Boghossian. Uma teoria popular, especialmente entre os positivistas
lógicos do século XX, é o que Boghossian chama de "explicação analítica do
a priori". A distinção inicial entre proposições analíticas e sintéticas
foi introduzida por Kant. Embora a distinção original tenha se baseado
principalmente na contenção conceitual, a versão contemporânea envolve, em
grande parte, as noções de "verdade com base nos significados e
independentemente dos fatos", conforme expresso pelo filósofo
americano W. V. O. Quine.
Proposições analíticas são consideradas verdadeiras
unicamente em virtude de seus significados, enquanto proposições a posteriori
são consideradas verdadeiras devido a seus significados e a certos fatos sobre
o mundo. De acordo com a explicação analítica do a priori, todo conhecimento a
priori é, portanto, analítico. Assim, não seria necessário postular uma
faculdade especial de intuição pura, já que o conhecimento a priori poderia ser
explicado simplesmente pela capacidade de compreender o significado da
proposição em questão. Em termos mais simples, defensores dessa explicação
afirmaram ter reduzido uma suposta faculdade metafísica da razão pura a uma
noção legítima de analiticidade dentro do âmbito linguístico.
No entanto, a explicação analítica do conhecimento a priori
tem sido alvo de várias críticas. Em particular, Quine argumenta que a
distinção entre o analítico e o sintético é ilegítima: "Apesar de sua razoabilidade a priori, uma fronteira clara
entre afirmações analíticas e sintéticas simplesmente não foi estabelecida. A
existência de tal distinção é um dogma metafísico, sem base empírica, dos
empiristas". Embora a solidez dessa crítica seja amplamente
debatida, ela teve um impacto significativo no projeto de explicar o a priori
em termos de analiticidade.
Para ilustrar essa discussão, podemos considerar o seguinte
exemplo: a afirmação "Todos os solteiros não são
casados" é uma proposição analítica, pois a verdade da afirmação
pode ser determinada apenas pelo significado dos termos envolvidos. Por outro
lado, a afirmação "João é um solteiro" é uma proposição a posteriori,
pois sua veracidade depende não apenas do significado dos termos, mas também de
fatos sobre o mundo, como a condição civil de João.
A Relação entre Verdades Necessárias, Verdades
Contingentes e o Conhecimento
A distinção metafísica entre verdades necessárias e
contingentes também está relacionada ao conhecimento a priori e a posteriori.
Uma proposição necessariamente verdadeira é aquela em que sua negação leva a
uma contradição lógica. Isso significa que essa proposição é verdadeira em
todos os possíveis cenários ou mundos concebíveis. Por exemplo, consideremos a
afirmação "todos os triângulos têm três lados": sua negação (ou
seja, a afirmação de que alguns triângulos têm quatro lados) é incoerente,
pois vai contra o conceito básico de um triângulo e sua definição. Como as
contradições são impossíveis, as proposições autocontraditórias são
necessariamente falsas, pois não há possibilidade de serem verdadeiras. A
negação de uma proposição autocontraditória é, portanto, necessariamente
verdadeira.
Por outro lado, uma proposição contingente é aquela em que
sua negação não leva a uma contradição lógica. Isso significa que essa
proposição não é verdadeira em todos os possíveis cenários. Como Jason Baehr
sugere, é plausível afirmar que todas as proposições necessárias são conhecidas
a priori, porque "a experiência sensorial apenas
nos informa sobre o mundo real e, portanto, sobre o que é o caso; ela não pode
nos dizer nada sobre o que deveria ou não deveria ser o caso".
Seguindo a perspectiva de Kant, alguns filósofos
consideraram a relação entre aprioricidade, analiticidade e necessidade como
extremamente próxima. Jerry Fodor, por exemplo, afirma que "o
positivismo, em particular, assumiu que verdades a priori devem ser necessárias".
No entanto, desde Kant, a distinção entre proposições analíticas e sintéticas
sofreu algumas mudanças. As proposições analíticas eram amplamente consideradas
"verdadeiras em virtude dos significados e independentemente dos fatos",
enquanto as proposições sintéticas exigiam algum tipo de investigação empírica,
observando o mundo, para determinar sua verdade ou falsidade.
Publicidade
A Relação entre Aprioricidade, Analiticidade e
Necessidade
Ao longo do tempo, os conceitos de aprioricidade,
analiticidade e necessidade têm sido abordados de maneira cada vez mais
distinta. Saul Kripke, filósofo americano, apresentou argumentos sólidos contra
a visão tradicional, argumentando a existência de verdades a posteriori que são
necessárias. Por exemplo, a afirmação de que a água é H2O (se for
verdadeira): segundo Kripke, essa afirmação é necessariamente verdadeira,
pois a água e o H2O são a mesma coisa, são idênticos em todos os possíveis
cenários e as verdades de identidade são logicamente necessárias. Contudo, essa
afirmação é conhecida apenas por meio de investigação empírica. Com base nessas
considerações de Kripke e de outros filósofos, como Hilary Putnam, há uma
tendência em fazer uma distinção mais clara entre aprioricidade, necessidade e
analiticidade.
As definições propostas por Kripke para esses termos
diferem sutilmente das de Kant. Levando em conta essas diferenças, a análise
polêmica de Kripke sobre a nomeação como contingente e a priori, de acordo com
Stephen Palmquist, encaixa-se melhor na estrutura epistemológica de Kant quando
é chamada de "analítica a posteriori". Aaron Sloman defendeu
brevemente as três distinções propostas por Kant (analítico/sintético, a
priori/empírico e necessário/contingente), destacando que não é necessário
assumir "semânticas mundiais possíveis" para a terceira distinção,
apenas que parte deste mundo poderia ter sido diferente.
A relação entre aprioricidade, necessidade e analiticidade
não é facilmente discernível. No entanto, a maioria dos filósofos concorda, em
algum grau, que embora essas distinções possam se sobrepor, as noções não são
idênticas: a distinção entre a priori e a posteriori é de natureza
epistemológica; a distinção entre analítico e sintético é linguística; e a
distinção entre necessário e contingente é de natureza metafísica.
Contexto Histórico do Termo A Priori e A
Posteriori
O surgimento dos termos a priori e a posteriori está
intimamente ligado ao desenvolvimento do pensamento filosófico durante o início
do período moderno europeu. A expressão "a priori", que
significa "do que vem antes" ou "dos primeiros
princípios, antes da experiência", tem suas raízes no latim. Por outro
lado, "a posteriori", que significa "do que vem depois"
ou "depois da experiência", também é derivado do latim.
Esses termos começaram a ganhar destaque em traduções
latinas dos Elementos de Euclides, uma obra matemática que foi amplamente
considerada como um modelo de pensamento preciso durante esse período
histórico. A presença desses termos nessas traduções demonstra sua relevância
crescente na discussão filosófica.
Uma das primeiras formulações filosóficas de uma noção que
pode ser considerada como conhecimento a priori, embora não tenha sido chamada
por esse nome, é encontrada na teoria da rememoração de Platão, descrita no
diálogo Meno. Segundo essa teoria, algo semelhante ao conhecimento a priori é
inerente à mente humana, sendo um conhecimento intrínseco que não depende da experiência.
No século XIV, Alberto da Saxônia, um lógico da época, fez
uso tanto do termo a priori quanto a posteriori em seus escritos. No entanto,
foi com G. W. Leibniz, no final do século XVII, que essas distinções receberam
uma atenção mais sistemática. Leibniz introduziu uma diferenciação entre
critérios a priori e a posteriori para discutir a possibilidade de uma noção em
seu tratado intitulado "Meditações sobre
Conhecimento, Verdade e Ideias" (1684). Além disso, ele
também empregou argumentos a priori e a posteriori para tratar da existência de
Deus em sua Monadologia (1714).
Outro filósofo importante que abordou essa distinção foi
George Berkeley, em sua obra "Um Tratado Sobre os Princípios do
Conhecimento Humano" (1710), no qual ele delineou a diferença
entre conhecimento a priori e a posteriori no Parágrafo XXI.
Esses marcos históricos demonstram a evolução e a
importância crescente dos conceitos de conhecimento a priori e a posteriori no
pensamento filosófico europeu durante os períodos moderno e iluminista. Desde
então, essas distinções têm sido amplamente discutidas e refinadas por
filósofos de diferentes correntes de pensamento, desempenhando um papel
fundamental na epistemologia e na compreensão do conhecimento humano.
A Filosofia de Immanuel Kant: Explorando o
Conhecimento A Priori
Kant, Imagem de Наталия por Pixabay
Immanuel Kant, renomado filósofo alemão do século XVIII,
apresentou uma abordagem única ao combinar elementos das teorias racionalistas
e empiristas. Em sua obra de 1781, Kant sustenta que, embora todo nosso
conhecimento comece com a experiência, isso não implica que ele surja
exclusivamente da experiência. Segundo ele, há uma distinção entre cognição a
priori, que é transcendental e baseada na forma de todas as experiências
possíveis, e cognição a posteriori, que é empírica e se apoia no conteúdo da
experiência.
Ao contrário do uso contemporâneo do termo, Kant argumenta
que o conhecimento a priori não é totalmente independente do conteúdo da
experiência. Diferentemente dos racionalistas, Kant acredita que a cognição a
priori, em sua forma pura, ou seja, sem qualquer mistura de conteúdo empírico,
se restringe à dedução das condições para a experiência ser possível. Essas
condições a priori, chamadas de transcendentais, são fundamentadas nas
faculdades cognitivas de um indivíduo e não são fornecidas pela experiência em
geral, nem por qualquer experiência específica (embora haja um argumento de que
as intuições a priori podem ser "despertadas" pela
experiência).
Kant desenvolveu o conceito de uma lógica transcendental
para investigar a dedução do conhecimento a priori em sua forma pura. Ele
identificou o espaço, o tempo e a causalidade como intuições puras a priori.
Kant argumentou que essas intuições puras a priori são estabelecidas por meio
de sua estética transcendental e sua lógica transcendental. Ele afirmou que o
sujeito humano não teria a mesma experiência que tem se essas formas a priori
não fossem, de alguma forma, constitutivas do sujeito humano. Por exemplo, uma
pessoa não perceberia o mundo como um lugar ordenado e governado por regras se
o tempo, o espaço e a causalidade não fossem funções determinantes na forma
como as faculdades perceptivas operam. Em outras palavras, não pode haver
experiência em geral sem a presença de espaço, tempo ou causalidade como
determinantes particulares. Essa afirmação é mais conhecida como a dedução
transcendental de Kant e constitui o argumento central de sua principal obra, a
"Crítica da Razão Pura". A dedução transcendental argumenta
que o tempo, o espaço e a causalidade são tanto ideais quanto reais.
Considerando a possibilidade de uma lógica do conhecimento
a priori, a dedução mais famosa de Kant buscou com sucesso defender o papel da
subjetividade, examinando o que constitui a subjetividade e qual relação ela
mantém com a objetividade e o empírico.
A filosofia de Kant representa uma contribuição profunda
para a compreensão do conhecimento humano, destacando a importância das
estruturas a priori na nossa percepção e compreensão do mundo. Seu trabalho
continua a ser objeto de estudo e debate, influenciando diversas áreas da
filosofia contemporânea.
A Crítica de Fichte ao Idealismo de Kant: Uma
Visão Controversa
Arthur Schopenhauer, Imagem de Ntguilty por Pixabay
Após o falecimento de Immanuel Kant, diversos filósofos se
encontraram engajados em corrigir e expandir sua filosofia, o que levou ao
surgimento de diferentes formas de idealismo alemão. Um dos críticos e
discípulos de Kant foi Johann Fichte. No entanto, seu aluno Arthur Schopenhauer
o acusou de rejeitar a distinção entre conhecimento a priori e conhecimento a
posteriori.
Schopenhauer argumentou que Fichte, ao perceber que a
"coisa-em-si" havia sido desacreditada, rapidamente construiu
um sistema filosófico sem a necessidade dessa noção. Assim, ele rejeitou a
suposição de que existia algo além de nossas próprias representações e,
consequentemente, permitiu que o sujeito cognoscente se tornasse tudo em tudo,
ou pelo menos que ele pudesse produzir tudo a partir de seus próprios recursos.
Para Schopenhauer, isso implicava na supressão da parte essencial e mais
valiosa da doutrina kantiana, a distinção entre o conhecimento a priori e o
conhecimento a posteriori, bem como entre o fenômeno e a "coisa-em-si".
Fichte afirmava que tudo era conhecimento a priori, sem apresentar qualquer
evidência convincente para essa afirmação, recorrendo a sofismas e
demonstrações questionáveis, cujo absurdo se escondia sob uma aparência de
profundidade e incompreensibilidade. Além disso, Fichte corajosamente apelou
para a intuição intelectual, ou seja, para a inspiração, como fundamento de seu
sistema.
Essa crítica de Schopenhauer revela uma divergência
significativa entre Fichte e Kant, colocando em xeque o legado e a validade da
filosofia kantiana. Enquanto Kant enfatizava a importância da distinção entre
conhecimento a priori e conhecimento a posteriori, bem como entre o mundo
fenomênico e a realidade em si, Fichte parece ter abandonado essas distinções,
preferindo um sistema que se baseasse inteiramente nas capacidades e na
atividade do sujeito cognoscente.
Essa controvérsia entre Fichte e Kant desencadeou debates
acalorados no cenário filosófico da época e continua a ser discutida até os
dias de hoje. As críticas de Schopenhauer levantam questões importantes sobre a
validade e a consistência do sistema filosófico de Fichte, assim como sobre as
implicações de suas rejeições em relação à teoria do conhecimento de Kant.
A disputa entre Kant e Fichte evidencia a natureza dinâmica
e em constante evolução da filosofia, com diferentes pensadores interpretando e
reinterpretando as ideias uns dos outros. Esses debates filosóficos contribuem
para o enriquecimento do pensamento crítico e para uma compreensão mais
profunda dos fundamentos do conhecimento humano.
Referências Bibliográficas
GREENBERG, Robert. A teoria kantiana do conhecimento a priori. University Park, PA: Penn State Press, 2001.
HEISENBERG, Werner. Física e Filosofia: A Revolução na
Ciência Moderna. Nova York, NY: Harper Perennial Modern Classics, 2007. (Edição
original publicada em 1958).
HUME, David. Uma Investigação sobre o Entendimento Humano. Edição organizada por Peter Millican. Oxford, Reino Unido: Oxford University Press, 2008. (Edição original publicada em 1777).
JENKINS, C. S. "Conhecimento a priori: debates e desdobramentos". Bússola da Filosofia, v. 3, n. 3, maio de 2008, pp. 436–450.
KANT, Emanuel. Prolegomena zu einer jeden künftigen Metaphysik [Prolegomena to any Future Metaphysics]. (Obra em alemão).
KRIPKE, Saul. "Nomeando e Necessidade". In: Semântica da Linguagem Natural. 2ª ed. Synthese Library. Springer, 2013. (Edição original publicada em 1972).
LOCKE, John. Um ensaio sobre o entendimento humano. Edição organizada por Peter H. Nidditch. Edição Clarendon das Obras de John Locke. Oxford, Reino Unido: Oxford University Press, 1689.
PALMQUIST, Stephen. "Conhecimento A Priori em Perspectiva: (I) Matemática, Método e Intuição Pura". A Revisão da Metafísica, v. 41, n. 1, setembro de 1987, pp. 3–22.
PLATÃO. "Eu não". In: Obras Completas. Edição
organizada por John M. Cooper e D. S. Hutchinson. Indianápolis, IN: Hackett
Publishing Co., 1997. (Obra em tradução).
0 Comentários