Cleriston Pereira da Cunha sofreu um incidente
de saúde inesperado nas instalações do complexo penitenciário da Papuda.
Apoiadores de Bolsonaro, que previamente não demonstravam interesse pelo
sistema carcerário, estão agora expressando críticas ao Supremo Tribunal
Federal, após a morte do detento.
Cleriston Pereira da Cunha deixa sua mulher e duas filhas. Foto: Reprodução Metrópoles |
Política- Ontem, um dos detidos
durante os tumultos no Congresso em 8 de janeiro faleceu após sofrer uma
emergência médica durante o período de recreação no Complexo da Papuda, em
Brasília. Cleriston Pereira da Cunha teve complicações por volta das 10h no
pátio do setor de confinamento da prisão. Apesar dos esforços das equipes do
Samu e do Corpo de Bombeiros, ele não conseguiu resistir. A notícia do
falecimento de Cleriston foi comunicada à sua esposa e às suas duas filhas.
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A juíza Leila Cury, da Vara de Execuções Penais do Distrito
Federal, encaminhou a informação ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Conforme dados da Secretaria de Administração Penitenciária do DF, Cleriston
era acompanhado por uma equipe multidisciplinar da Unidade Básica de Saúde da
Papuda desde sua prisão em janeiro. Ele estava em tratamento com medicamentos
controlados para diabetes e hipertensão. Cleriston estava enfrentando acusações
em uma ação penal por associação criminosa armada, abolição violenta do Estado
Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de
patrimônio tombado.
A equipe jurídica do detento havia solicitado ao ministro
Alexandre de Moraes a concessão de liberdade provisória. Em setembro, a
Procuradoria-Geral da República emitiu um parecer favorável, mas ainda não
havia emitido uma decisão formal sobre a solicitação. Após a morte, Moraes
solicitou à Papuda informações abrangentes sobre o caso, incluindo uma cópia do
prontuário e do relatório médico dos cuidados prestados a Cleriston durante sua
detenção.
A morte de Cleriston gerou reações críticas por parte dos
aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), dirigidas ao STF e ao
ministro Alexandre de Moraes. O senador e ex-vice-presidente Hamilton Mourão
(Republicanos-RS) expressou desaprovação pelo fato de Cleriston ter permanecido
detido até ontem, mesmo com o parecer favorável da PGR. Mourão argumentou que o
falecimento do homem representa uma "burocracia que tem restringido os
direitos dos detentos". O general enfatizou a necessidade de uma
investigação detalhada para esclarecer esse acontecimento grave.
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O parlamentar Ubiratan Sanderson (PL-RS), o mesmo
que em 2020 recebeu uma denúncia de assédio sexual praticada por Pedro
Guimarães, então presidente da Caixa Econômica Federal, por meio de uma
funcionária graduada do banco, agora está na presidência da Comissão de
Segurança Pública da Câmara dos Deputados. Na ocasião, diante do depoimento da
vítima, o deputado Ubiratan optou por ignorar a denúncia, pedindo provas para
um caso que, por natureza, não costuma deixar evidências. Ele manifestou
questionamentos sobre os motivos que levaram à morte do preso.
Enquanto isso, a deputada Carla Zambelli (PL-SP),
que enfrenta acusações por porte ilegal de arma de fogo devido a um incidente
em outubro, quando perseguiu um homem após uma discussão, declarou que seu
gabinete está colaborando com a bancada de oposição ao governo para realizar
uma "apuração dos fatos relacionados a essa notícia".
O antigo parlamentar e ex-procurador Deltan Dallagnol
(Novo-PR), que teve seu mandato cassado devido ao uso de artifícios para
evitar Processos Administrativos Disciplinares (PADs) ou outras
situações relacionadas a alegada improbidade administrativa e prejuízo aos
recursos públicos, destacou a aprovação da Procuradoria-Geral da República (PGR)
para a concessão da liberdade provisória a Cleriston.
Opinião do Michel
Caro leitor,
Ao nos depararmos com a notícia do falecimento de Cleriston
Pereira da Cunha no complexo penitenciário da Papuda, somos confrontados mais
uma vez com a complexidade e brutalidade que permeiam o sistema prisional
brasileiro. A tragédia não apenas expõe as condições adversas enfrentadas por
todos os detentos, mas também suscita reflexões sobre a responsabilidade do
Estado e a necessidade urgente de reformas no sistema carcerário.
A morte de Cleriston não deve ser encarada isoladamente,
mas sim como um sintoma de um problema estrutural mais amplo. É inquietante
observar como, em meio às críticas ao Supremo Tribunal Federal por alguns
apoiadores do ex-presidente Bolsonaro, o foco muitas vezes se desloca da
discussão fundamental sobre as condições desumanas que permeiam nossas prisões.
A análise da situação de Cleriston revela um aspecto
crucial: a saúde do detento, mesmo em meio a acusações sérias, deve ser tratada
com a devida importância. A atenção médica a detentos é uma responsabilidade
que transcende a natureza do crime cometido. A notícia de que ele estava sob os
cuidados de uma equipe multidisciplinar desde sua detenção, recebendo
tratamento para diabetes e hipertensão, levanta questões sobre a eficácia do
sistema em garantir a dignidade humana, mesmo em um contexto de prisão.
A abordagem do ministro Alexandre de Moraes, que solicitou
informações detalhadas sobre o caso após o óbito de Cleriston, é louvável.
Entretanto, é imperativo que a investigação vá além das circunstâncias
imediatas da morte e aborde as deficiências estruturais que contribuem para a
fragilidade do sistema prisional brasileiro.
Ao analisar a postura de Hamilton Mourão, é inevitável
notar uma discrepância notável entre a sua preocupação destacada em relação aos
detentos do caso da invasão de 8 de janeiro e a retórica mais ampla associada à
extrema direita, que muitas vezes ecoa a frase "bandido bom é bandido
morto". Essa aparente dualidade reflete não apenas uma inconsistência no
discurso, mas também revela uma preocupação seletiva em relação aos direitos
dos presos.
Enquanto Mourão destaca a "burocracia que tem
restringido os direitos dos detentos" no contexto específico dos
envolvidos na invasão, é difícil ignorar a falta de uma abordagem semelhante e
proativa em relação ao sistema carcerário como um todo. O lema "bandido
bom é bandido morto" frequentemente associado à extrema direita sugere uma
abordagem punitiva e desumanizadora, em contraste com a ênfase pontual de
Mourão na necessidade de uma análise crítica e investigação detalhada em circunstâncias
específicas.
Essa seletividade na preocupação pelos direitos dos
detentos levanta questionamentos sobre a consistência e a coerência nas
políticas e posicionamentos daqueles que lideram e influenciam o debate
público. Se a preocupação de Mourão é genuína e estende-se além do caso
específico, seria prudente esperar uma defesa mais ampla dos direitos dos
presidiários em todos os contextos.
A dicotomia entre a postura crítica em relação aos detentos
do caso de 8 de janeiro e a retórica mais ampla que muitas vezes sugere uma
abordagem mais rígida e punitiva para todos os presos evidencia a complexidade
e a polarização nas discussões em torno da justiça criminal no Brasil. É uma
oportunidade para repensar e debater abordagens mais equitativas e humanitárias
no tratamento de todos os detentos, independentemente do caso específico ao
qual estejam associados.
Em última análise, a morte de Cleriston Pereira da Cunha
não pode ser ignorada como uma mera fatalidade. Ela é um chamado à reflexão
sobre a necessidade urgente de reformas estruturais em nosso sistema prisional,
assegurando que a punição de crimes seja justa e proporcional, mas também que a
dignidade e os direitos básicos dos detentos sejam preservados.
Atenciosamente,
Fernando Michel
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