O novo impulso na extração de petróleo na região traz à tona questões sobre o papel desses países nesse cenário em meio às mudanças climáticas e às transformações na indústria energética.
Os protagonistas do novo boom de petróleo na América Latina. Imagem de Michael por Pixabay |
Apesar de parecer paradoxal, a produção global de petróleo
está prevista para aumentar nesta década, mesmo diante da crise das mudanças
climáticas, de acordo com projeções da Agência Internacional de Energia
(AIE).
Análises indicam que nos anos vindouros, haverá uma
contínua demanda global por maiores volumes de petróleo bruto. Contudo, até o
término desta década, antecipa-se uma inversão dessa tendência, à medida que as
energias renováveis ganham terreno em relação aos combustíveis fósseis.
Até que essa mudança ocorra, o petróleo continuará sendo o
principal motor da economia global. Nesse cenário, projeções da AIE apontam que
a produção mundial de petróleo irá aumentar em cerca de 5,8 milhões de barris
diários até 2028, e aproximadamente um quarto desse aumento provirá da América
Latina.
Quais países emergirão como líderes nesse novo
surto de crescimento?
Brasil, Guiana e, em menor medida, Argentina, estão na
vanguarda desse novo estágio de produção de petróleo na região. Por outro lado,
nações como Venezuela, México, Equador e Colômbia, que já foram dominantes,
estão destinadas a diminuir a oferta de petróleo bruto no mercado global nos
próximos cinco anos, de acordo com análises da AIE.
Segundo Francisco Monaldi, diretor do Programa
Latino-Americano de Energia do Instituto Baker Institute, sediado na
Universidade Rice (EUA), a reversão desse declínio é uma tarefa extremamente
complexa para esses países, destacou ele em entrevista à BBC News Mundo.
Brasil: Destaque na Produção de Petróleo na
Região
O Brasil e a Guiana emergem como figuras centrais no
cenário do boom de petróleo na América Latina. As raízes da história brasileira
estão enredadas nas descobertas subaquáticas, com extração de fontes de
combustível ocorrendo a mais de três quilômetros de profundidade sob a água e
outras cinco camadas de rocha e sal. Essa riqueza proveniente das jazidas do
pré-sal transformou o curso do país, fazendo-o superar o México e assumir a
liderança como o principal produtor de petróleo da América Latina em 2017. Em
contrapartida, a Venezuela, outrora ícone petroleiro da região, enfrentava uma
profunda crise que resultou no colapso de sua produção. Nos últimos seis anos,
o Brasil ampliou continuamente sua produção de petróleo, atingindo a marca de
2,2 milhões de barris em 2022, o que o posicionou como o oitavo maior produtor
global. No entanto, a relevância não está somente na quantidade de barris
diários, mas também na eficiência e lucratividade da produção de petróleo bruto
no Brasil e na Guiana, que superam outros países. Considerando os efeitos
poluentes do petróleo, uma das principais causas da crise climática global,
ambos os países emitem menos CO2 por barril produzido em comparação com a média
mundial, conforme argumenta Monaldi. Dado o comprometimento de muitas nações em
reduzir suas emissões, é provável que esse tipo de petróleo possa enfrentar uma
demanda crescente no futuro.
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Guiana: Da Pobreza à Riqueza Aparente
Guiana, um país com uma população de aproximadamente 800
mil habitantes, costumava ser um dos menores e mais carentes países da América
do Sul. Contudo, essa realidade começou a mudar em 2015, quando a ExxonMobil,
uma gigante norte-americana, identificou a primeira de suas comprovadas
reservas de petróleo bruto, estimadas em cerca de 11 bilhões de barris, nas
profundezas do Oceano Atlântico.
Aproveitando a crescente demanda global por petróleo ao
longo desta década, a Guiana está acelerando sua produção e há expectativas de
que alcance até 1,2 milhão de barris por dia até 2028. Caso essas projeções se
concretizem, o país poderia ultrapassar o Kuwait e tornar-se o maior produtor
per capita de barris no mundo, de acordo com a análise de Monaldi.
Nesse cenário, a Guiana passaria por uma transformação
econômica significativa, saindo da pobreza em direção à riqueza aparente,
considerando o impressionante crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) – um
aumento de 57,8% no ano passado e previsão de 37,2% para este ano.
No entanto, permanece incerto como essa nova riqueza da
Guiana será distribuída. O governo expressou intenções de evitar os erros
cometidos por nações petrolíferas no passado, mas administrar a destinação dos
recursos gerados a partir dessa abundância marítima será um desafio
considerável.
Argentina: Crescimento na Indústria do Petróleo
Na terceira posição, encontra-se a Argentina, que apesar de
enfrentar uma inflação anual superior a 100% e uma crise crônica de
endividamento, testemunha um aumento na produção de petróleo e gás nos últimos
anos.
No epicentro desse avanço está o Vaca Muerta, um vasto
campo situado no noroeste do país que abriga a segunda maior reserva mundial de
gás de xisto e a quarta maior de óleo de xisto. Ambos os recursos são extraídos
de forma "não convencional", ou seja, por meio da técnica de fratura
hidráulica, também conhecida como fracking.
As perspectivas para a evolução da indústria petrolífera
argentina são positivas. A Agência Internacional de Energia (AIE) prevê que a
produção atingirá 700 mil barris diários neste ano, enquanto estimativas da
consultoria Rystad Energy sugerem um possível aumento para 1 milhão de barris
diários até o fim da década.
Contudo, a partir de 2030, projeções indicam um declínio,
uma vez que a produção de petróleo convencional continuará a diminuir e a
produção de xisto não será suficiente para compensar essa queda. Caso essa
previsão se concretize, o crescimento expressivo no comércio de petróleo seria
temporário, cedendo espaço para níveis mais baixos de produção.
Adicionalmente, especialistas ressaltam que a produção não
convencional demanda investimentos substanciais em longo prazo. Isso requer uma
garantia de estabilidade nas políticas do setor, o que é um desafio
previsivelmente complexo na Argentina.
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Ficando em Retaguarda
Os antigos líderes da produção de petróleo na região estão
agora ficando em segundo plano.
No México, a produção atingiu seu ponto máximo em 2004 e,
desde então, caiu pela metade.
Para tentar reverter essa situação, o governo liderado por
Andrés Manuel López Obrador buscou impulsionar o desenvolvimento da Pemex, a
estatal de petróleo, porém, até o momento, os resultados esperados não foram
alcançados.
Apesar de terem sido concedidos milhões de dólares em
incentivos fiscais e outras formas de assistência financeira à empresa, a Pemex
não conseguiu se recuperar.
Com um passivo de mais de US$ 100 bilhões (aproximadamente
R$ 490 bilhões), a Pemex enfrenta o título de ser a empresa petrolífera mais
endividada globalmente.
"Além de ter propósitos comerciais, a Pemex também
atua com motivações políticas", aponta Diego Rivera, pesquisador associado
do Centro de Política Energética Global da Universidade de Columbia, nos
Estados Unidos. "A produção entrou em pausa."
Por outro lado, a PDVSA, a estatal petrolífera da
Venezuela, enfrentou um acentuado declínio, diretamente associado à crise
econômica e política profunda que aflige o país.
A Pemex é a empresa petrolífera mais endividada do mundo
A Pemex é a empresa petrolífera mais endividada do mundo©
A produção de petróleo da Venezuela, em sua maioria de
qualidade pesada e densa, desabou de 3,4 milhões de barris por dia em 1998 para
700 mil na atualidade.
"O que está ocorrendo na Venezuela é uma queda abrupta
que pode ser atribuída a razões que vão desde negligência até corrupção",
destaca Rivera.
Em Paralelo, no Caso do Equador, Previsões de Especialistas
Indicam uma Queda das Atuais 460 mil Barris por Dia para 370 mil em 2028.
Essa Redução Afetaria Significativamente o País, uma vez
que sua Economia Dependente das Receitas do Petróleo Mais do que Qualquer Outro
País na América Latina.
Enquanto Isso, na Colômbia, a Situação Está Tomando um Rumo
Diferente. O Governo do Presidente Gustavo Petro Tem a Intenção de Promover uma
Transição Energética no País, Gradualmente Reduzindo a Produção de Petróleo.
Recentemente, Foram Emitidas Licenças para Projetos de
Energia Renovável na Província de La Guajira, com a Esperança de que a Energia
Limpa Gerada naquela Região Possa Suprir Todas as Necessidades de Eletricidade
do País.
A Proposta é que Esse Tipo de Projeto Possa Compensar a
Queda nas Exportações de Petróleo sem Prejudicar a Economia, Contudo, Alguns
Especialistas Estão Altamente Céticos sobre a Viabilidade dessa Meta ser
Alcançada nos Próximos Anos.
Petro busca Promover a Mudança Ambiental na
Colômbia
O Que Aguarda na Próxima Década
No Momento, não se Tem Clareza sobre a Velocidade com que a
Transição Energética na Região Avançará e Até que Ponto o Mundo Continuará a
Demandar Petróleo na Próxima Década.
"Contudo, Existem Muitos Fatores que Escapam do Nosso
Controle", Adverte Rivera, Tais como a Invasão da Ucrânia pela Rússia ou
Pandemias.
"Uma Coisa que Podemos Afirmar é que a Transição
Energética Será Complexa, Intricada e Caracterizada por Grande
Volatilidade", Acrescenta.
No Entanto, Se as Previsões da AIE para 2028 Forem
Confirmadas, Restam Poucos Anos para que o Pico de Demanda Se Encerre, Abrindo
Caminho para uma Nova Dinâmica na Produção Global de Energia.
Para o Período de 2030-2050, o Destino da América Latina
Estará Intrinsecamente Ligado ao que Acontecer com a Demanda nos Mercados
Internacionais.
Por que o Brasil Emergiu como um dos Líderes no Novo Surto
de Petróleo na América Latina
Por que o Brasil Emergiu como um dos Líderes no Novo Surto
de Petróleo na América Latina© Getty Images
Se o Mundo Alcançar a Meta de Emissões Líquidas Zero até
2050, "a Região Enfrentará Grandes Desafios", Afirma Monaldi.
Entretanto, Caso o Cenário Previsto pela Organização dos
Países Exportadores de Petróleo (Opep) se Concretize, com uma Estabilização da
Demanda ao Invés de uma Queda, "a América Latina Se Destacaria, uma Vez
que É a Região com as Maiores Reservas de Petróleo no Mundo, Depois do Oriente
Médio", Declarou o Especialista.
Opinião do Michel
Qual é o Papel dos Países na Era do Petróleo e
das Mudanças Climáticas?
No cenário atual, onde o Brasil, Guiana e Argentina se
destacam como protagonistas no renovado impulso da produção de petróleo na
América Latina, é impossível ignorar o profundo impacto que essa evolução tem
sobre a trajetória da região em meio às mudanças climáticas e às transformações
na indústria energética global.
A ascensão desses países como líderes na extração de
petróleo abre um intenso debate sobre o equilíbrio entre as necessidades
econômicas e a responsabilidade ambiental. O impulso na produção de petróleo
traz consigo a promessa de crescimento econômico, geração de empregos e
oportunidades de desenvolvimento. No entanto, esse cenário não pode ser
dissociado das preocupações crescentes sobre o aquecimento global e a
necessidade premente de transição para fontes de energia mais limpas e
sustentáveis.
Enquanto o Brasil e a Guiana emergem como potências
petrolíferas, a pressão aumenta para que esses países adotem práticas mais
conscientes em relação às emissões de carbono. O uso mais eficiente e lucrativo
na produção de petróleo bruto não deve ser uma desculpa para postergar a
transição para energias renováveis. A crise climática exige ações concretas e o
engajamento dos setores público e privado na busca por alternativas que
minimizem os impactos ambientais.
A situação na Argentina, por sua vez, ilustra um dilema
entre desenvolvimento econômico e sustentabilidade. O impressionante campo de
Vaca Muerta, com suas vastas reservas de gás e óleo de xisto, oferece
oportunidades de crescimento, mas também suscita questionamentos sobre o uso de
técnicas não convencionais de extração, como o fracking. O país enfrenta o
desafio de equilibrar a necessidade de recursos com a proteção do meio ambiente
e o bem-estar das comunidades locais.
É crucial que esses países sejam atores proativos na busca
de soluções para os desafios impostos pelo cenário atual. O mundo está
observando e esperando uma abordagem responsável e estratégica que possibilite
a coexistência da produção de petróleo com a preservação ambiental. A história
nos ensina que a exploração desenfreada dos recursos naturais pode resultar em
consequências irreversíveis.
A trajetória do Brasil, Guiana e Argentina na era do petróleo e das mudanças climáticas será moldada pelas escolhas que fizerem hoje. O equilíbrio entre progresso econômico e sustentabilidade ambiental é uma encruzilhada que exige liderança visionária, cooperação internacional e um compromisso firme com um futuro mais limpo e resiliente para as gerações vindouras.
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