A implementação da reforma tributária continua causando atritos entre os poderes Executivo e Legislativo

Após a aprovação da reforma tributária, o governo deve agora determinar os setores a serem favorecidos, contando com o respaldo e a cooperação do Congresso, onde a maioria é composta pela ala bolsonarista de extrema direita.

Promulgação da Reforma Tributária
Promulgação da Reforma Tributária. Foto: Reprodução Marcos Oliveira/Agência Senado

Política- Num sistema político como o do Brasil, é inviável exercer o governo sem o respaldo e o suporte do Congresso. Discrepâncias são esperadas, porém confrontos intensos entre o Executivo e o Legislativo podem impactar a chamada governabilidade. No ano de 2023, o presidente Lula experimentou triunfos e revés em sua interação com a Câmara e o Senado, aspectos que, no panorama geral, integram o jogo democrático.

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Recentemente, os embates na esfera econômica aumentaram, indicando que a gestão petista enfrentará desafios consideráveis em 2024. No final do ano passado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve que buscar soluções fiscais para lidar com a prorrogação da isenção de impostos sobre a folha de pagamento imposta pelo governo. Agora, no início do novo ano, Haddad já enfrenta críticas do próprio partido, PT, que questiona sua ambiciosa meta de eliminar o déficit nas contas públicas, rotulada como austericídio fiscal pela presidente do partido, Gleisi Hoffmann. Nas próximas semanas, são esperados mais conflitos, especialmente relacionados à reforma tributária, um tema crucial para o país.

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A reforma tributária foi promulgada pelo Congresso Nacional em 20 de dezembro, marcando um ponto histórico. No entanto, sua implementação não está totalmente concluída, visto que pelo menos 70 pontos requerem regulamentação através de leis complementares que serão submetidas pelo governo ao Congresso nos próximos meses. Isso implica que há muito a ser discutido com os parlamentares que avaliarão as propostas. Embora as diretrizes fundamentais do novo sistema tributário estejam estabelecidas, o modo como as leis complementares serão redigidas pode impactar ou enfraquecer seu potencial efeito, conforme observado por Bráulio Borges, economista sênior da consultoria LCA e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

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A relação de questões que serão discutidas no Congresso é liderada pelo novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), assemelhando-se ao modelo adotado em nações desenvolvidas. O IVA tem a função de substituir cinco tributos, sendo três federais, um estadual e outro municipal, assegurando, assim, sua premissa principal de simplificação do sistema. Contudo, a eficácia do IVA depende crucialmente da alíquota que incidirá sobre produtos e serviços oferecidos pelos diversos setores econômicos. Embora o Ministério da Fazenda tenha estimado a taxa em 27,5%, uma das mais elevadas globalmente, a mesma pode aumentar devido às exceções e tratamentos diferenciados planejados para certos segmentos. Segundo cálculos do Ministério da Fazenda, sem exceções, o IVA ficaria entre 22% e 23%, conforme destacado por Alexandre Manoel, ex-secretário de Planejamento do Ministério da Economia e atual economista-chefe da AZ Quest Investimentos.

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O governo tem um prazo de 180 dias a partir da promulgação da reforma tributária para formular as leis complementares e submetê-las à análise parlamentar. A estratégia da equipe econômica consiste em consolidar tudo em 3 ou 4 grandes projetos de lei. O especialista em contas públicas, Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, antecipa um cenário desafiador para Fernando Haddad em 2024, divergindo das perspectivas otimistas sobre a reforma tributária. Salto projeta que o IVA poderá ultrapassar os 33% com todos os benefícios do projeto brasileiro, expressando ceticismo quanto à capacidade do Executivo e do Legislativo lidarem com a complexidade dos detalhes pendentes. Ele descreve a tarefa como árdua, prevendo que consumirá todo o crédito ainda disponível para o governo.

Dados da Reforma Tributária

Setores como transporte público, saúde e educação podem receber descontos significativos no imposto total, variando de 30% a 100%. Em outras palavras, considerando a alíquota padrão do IVA em 27%, esses setores poderiam pagar de 18,9% a nada. Além disso, serviços financeiros, mercado imobiliário, restaurantes e agências de viagens, entre outros, estão previstos para terem regimes especiais com formas de cobrança específicas. Por outro lado, há críticas de setores que não foram contemplados com esses benefícios. Companhias aéreas argumentam que o pagamento da alíquota completa do IVA, de 27,5%, aumentará os custos tributários em R$ 12 bilhões anuais, impactando certamente nos preços das passagens.

Os debates estão no estágio inicial, e é certo que o Congresso será alvo de vários interesses setoriais nos próximos meses. Um dos pontos de grande expectativa para os especialistas é a definição da chamada cesta Básica Nacional, inserida no projeto pela Câmara dos Deputados. Essa cesta terá isenção de impostos, mas é necessário especificar os produtos que se beneficiarão desse incentivo. Atualmente, a cesta de Referência abrange uma ampla variedade de produtos, variando em cada estado e incluindo alimentos, bebidas, produtos de higiene pessoal e limpeza. O propósito da reforma é estabelecer um padrão nacional único e reduzir a diversidade de mercadorias contempladas. A batalha pela cesta Básica se prevê intensa, com vários setores pleiteando a inclusão de seus produtos, enquanto o governo enfrenta o desafio de estabelecer critérios claros, conforme destacado por Bráulio Borges, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Dados do IVA

Segundo os cálculos do especialista, uma cesta contendo entre 50 e 70 produtos isentos representaria, por si só, um acréscimo de 2 pontos percentuais na alíquota padrão do IVA, aplicada aos outros setores. Caso a lista de itens isentos seja mais extensa, a alíquota do novo imposto poderia atingir 30%, ultrapassando o limite de 27,5% desejado pelo governo. Outro ponto de tensão será a definição dos produtos sujeitos ao imposto seletivo, conhecido como "imposto do pecado". A função desse tributo, comum em países que adotam um sistema baseado no IVA, é aplicar uma taxa extra sobre itens considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros, bebidas alcoólicas, alimentos ultraprocessados e combustíveis fósseis.

Dessa maneira, ao mesmo tempo em que desencoraja o consumo, fortalece a arrecadação. O dilema é que ninguém está disposto a participar dele. Apesar dos ajustes necessários que pairam sobre a reforma tributária, ela é mais do que bem-vinda. O complexo sistema tributário brasileiro sufoca empresas, prejudica consumidores e trava o crescimento econômico do país. Agora, a tarefa é persistir até o final para conter o aumento de exceções, conforme aponta Alexandre Manuel, da Az Quest. Nesse contexto, governo e Congresso devem manter alinhamento para resistir às inevitáveis pressões que surgirão de diversas direções.

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